20 dezembro 2007

HÍFEN – Cadernos de Poesia

13 números publicados desde Outubro de 1987 a Dezembro de 1999

Estes Cadernos, integralmente dedicados à publicação de poesia em português e noutras línguas, apresentaram o seu 1.º número em Outubro de l987, com colaborações inéditas, tiragem de 750 exemplares e periodicidade semestral. A partir do n.º 3 (Out. 88/Março 89) a revista passou a organizar-se tematicamente. Após este número intitulado A poesia/as outras artes, perfilhou-se, até ao último, esse tipo de estrutura, sempre com a necessária latitude multívoca, que qualquer trabalho com textos poéticos exige.

Os objectivos programáticos referidos no texto de apresentação do número inicial, aludiam à simbologia do título e propunham a confluência de diversificados dizeres, num todo, num só corpo. Nesta década vivia-se a sensação de algum esgotamento do poder subversivo das vanguardas e uma descrença na eficácia de rupturas, que quase sempre conduzem a revivescências modalizadas de atitudes estéticas muito anteriores ou de outras latitudes (o que poderá ser excelente, quando se atingem sínteses originais, entre traditio e revolutio).

Hífen escolhe, desde o início, o espaço de produção poética inter-geracional. E assim nas suas páginas tocam-se lado a lado poemas inéditos de grandes nomes da poesia e de outras vozes conhecidas e a conhecer. A esta publicação interessa surpreender essas vozes no labor comum de reaver as palavras inter-ditas, os silêncios in-tactos, o viço im-possível de uma visão in-audita e inicial.

Foram sucessivamente visitados os seguintes temas: Viagens (espacialidades e percursos interiores ou não); Tradução – número dedicado à (in)traduzibilidade da poesia - (poemas em diversas línguas - castelhano, italiano, francês, inglês, alemão, finlandês-, "mudados" por poetas portugueses), Heresias (que incluía a publicação de seis poemas inéditos de Jorge de Sena), Dias Inúteis (poética do quotidiano, com uma evocação tutelar, de Irene Lisboa), Artes Poéticas (respectivas «artes poéticas» dos poetas convidados), Poesia Hispânica (número dedicado à poesia em línguas ibéricas - galego, castelhano, catalão, basco), Anos 90 – alguns poetas (uma inicial aproximação à poesia da década em Maio de 97), O sítio das nascentes (origens, infância re-visitada ou re-inventada), Quatro PoéticasIrene Lisboa/Florbela Espanca/Natália Correia/Luiza Neto Jorge, (número dedicado à obra das quatro poetas portuguesas, com ensaios e poemas escolhidos por quatro ensaístas), Partituras (dedicada às contiguidades entre a poesia e a música).

A Hífen publicou, ao longo das suas treze edições, cerca de 160 poetas. Cumpriu a sua vocação inter-geracional, como se verifica, percorrendo os índices onde figuram inéditos de: Sophia de Mello Breyner, António Ramos Rosa, Eugénio de Andrade, Egito Gonçalves, Natália Correia, Fernando Guimarães, Fernando Echevarría, Ana Hatherly, Alberto Pimenta, Fiama Hasse de Pais Brandão, Maria Teresa Horta, Pedro Tamen, Vasco Graça Moura, Nuno Júdice, Gastão Cruz, Al Berto, Luís Miguel Nava, Joaquim Manuel Magalhães, Paulo Teixeira, Fernando Pinto do Amaral, Manuel António Pina, Adília Lopes, Ana Luísa Amaral, Rui Pires Cabral, Luis Quintais, Rui Cóias, João Luís Barreto Guimarães, etc, etc.
Poetas de outras línguas vertidos para português, em traduções inéditas, como: Antonio Machado, Jorge Luís Borges, Paul Celan, Sylvia Plath, Günter Grass, e. e. cummings, Ezra Pound, Thom Gunn, Ingeborg Bachmann, Roberto Juarroz, Dino Campana, Sandro Penna, etc, etc, incluindo aqui o n.º 9, integralmente dedicado às poéticas hispânicas.

Esta publicação sempre prezou a invenção gráfica, entregando essa concepção, no número inicial a Tiago Manuel e nos restantes a Nuno Lourenço e Jorge Figueira, e o espaço das suas capas a diversos artistas plásticos como: José Rodrigues, Alberto Carneiro, Tiago Manuel, Ana Hatherly, João Louro, Luís Palma, etc.

A partir do 5º número, o formato inicial de quadrado perfeito foi modificado para o tamanho A4 e reduziu-se a tiragem para 500 exemplares, pois o péssimo serviço da empresa de comércio livreiro, o modesto consumo de poesia, por parte dos leitores, a prevalência da ficção e o sindroma do best-seller para pôr na estante (num tempo sem net, onde ainda havia estantes…), foram implacáveis. Diversos números tiveram o apoio da Fundação Eng. António de Almeida, no Porto, com a aquisição de exemplares e nas últimas três edições foi concedida uma bolsa de apoio à edição, do Instituto Português do Livro e da Leitura, traduzida na aquisição de exemplares que a revista enviava a expensas próprias a uma rede de bibliotecas nacionais. O custo das embalagens e portes de correio revelavam-se, então, bastante desfavoráveis. O avolumar de dificuldades e a pesquisa temática que se pretendia exigente levaram à alteração e alargamento da periodicidade.

Hoje, como ontem, no texto introdutório a Viagens de 1989 ainda poderíamos desejar:
(…) Continuar a inserir-se livremente naquela fissura (…) de uma publicação à revelia de indústrias, controles culturais e outros (…) Lugar inseguro e aparentemente invertebrado (…) construção que sempre cria uma geografia final, inesperada e surpreendente.

Inês Lourenço
Outubro 2003

(texto solicitado pela Coimbra 2003 – Capital da Cultura, no âmbito de uma iniciativa dedicada a Revistas de Poesia dos Anos 80)